Arnobio Rocha Mitologia Ciúme Mortal

430: Ciúme Mortal

 

A Morte de Penteu

 

“salua animam tuam, noli respicere post tergum” (“salva tua vida, não olhes para trás” – Gênesis 19,17.26)

 

Entender o comportamento humano, mais ainda a psiquê, não é algo simples, ou racional, a observação, o estudo detido pode jogar alguma luz, onde não há qualquer fio de explicação. Caso extremo de ciúme que leva à morte, tantas vezes praticado por homens, mas também por mulheres, são crimes da “alma”, um afastamento da realidade, do senso comum, atingindo outras e estranhas relações de posse e poder sobre o outro, que não se justifica pela lógica simples e direta.

 

Fui buscar na mitologia grega alguma razão na psiquê humana que pudesse explicar o comportamento da Mulher que mata o marido por ciúmes, pensei talvez em Medeia, mas, apesar do ciúme exacerbado, ela não mata seu amado, Jasão, apenas destrói tudo o que para ele tinha valor – filhos dela com ele, a outra futura esposa. Mas não atendando contra a vida dele, atingindo-o de forma indireta, torturando sua alma, pelas traições e covardia.

 

O herói Orfeu, desceu ao inferno para buscar sua amada Eurídice, mas por um erro grave, de “olhar para trás” perde a chance de salvá-la, retornando sozinho de sua viagem pelo Hades.  Pelo imenso amor a sua mulher, Orfeu, decide não mais se relacionar com outras mulheres, porém como nos conta Junito de Souza Brandão, “As Mênades ultrajadas por sua fidelidade à memória da esposa, fizeram-no em pedaços”.

 

Continua o mestre, sobre o mito de Orfeu e sua morte violenta: “Há muitas variantes acerca da morte violenta do filho de Eagro. Vamos destacar duas delas. Conta-se que Orfeu, ao retornar do Hades, instituiu mistérios inteiramente vedados às mulheres. Os homens se reuniam com ele em uma casa fechada, deixando suas armas à porta. Uma noite, elas, enfurecidas, apoderaram-se dessas armas e mataram Orfeu e seus seguidores. Outra variante nos informa que, tendo servido de árbitro na querela entre Afrodite e Perséfone na disputa por Adônis, Calíope teria decidido que o lindíssimo filho de Mirra permaneceria uma parte do ano com uma e uma parte com outra. Magoada e irritada com a decisão, Afrodite, não podendo vingar-se de Calíope, vingou-se no filho. Inspirou às mulheres trácias uma paixão tão violenta e incontrolável, que cada uma queria o inexcedível cantor só para si, o que as levou a esquartejá-lo e lançar-lhe os restos e a cabeça no rio Hebro. Ao rolar da cabeça pelo rio abaixo, seus lábios chamavam por Eurídice e o nome da amada era repetido pelo eco nas duas margens do rio”.

 

O amor desmedido, o risco de perda, abandono, desprezo leva ao descontrole completo e  a morte passa a ser a opção, tanto do outro, como de si, ou de ambos. A relação lógica e racional de entender as consequências dos atos são inteiramente abandonadas, não restando nada além da violência primitiva.

 

O aspecto do esquartejamento, despedaçamento, algo que choca profundamente, revolta, tem sua explicação nos antigos ritos das Mênades( Bacantes) que quando possuídas pelo êxtase e entusiamo, a prática era comum, em regra em animais, não raro em homens, como fora com Penteu, por sua mãe, Agave, conforme a peça “As Bacantes” de Eurípedes, simbolizando o renascimento do Deus Dionísio.

 

São mistérios da alma, a psicologia, com ajuda da mitologia lança luzes para questões não facilmente compreendidas por nós, para que possamos refletir, pensar.

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