Arnobio Rocha Filmes&Músicas Gran Torino – Ato Penitencial

Gran Torino – Ato Penitencial

Gran Torino – A “delicada” relação entre Walt e Thao

Nestes dias escrevi sobre o Perdão ( Na Natureza Selvagem – O Perdão. ), um ato individual, mas sem que se efetivasse diante daqueles que tinham que ser perdoados. A própria fuga, não era daqueles que pediam o perdão, mas de si mesmo, uma busca desenfreada pelo nada, pelo vazio, para, no fim, descobrir que a felicidade estava em compartilhar com muitos, não sozinho. Uma contradição para quem fugia de tudo e todos.

Mas o processo do perdão, ou da culpa não expiada, leva quase que imediatamente ao isolamento ou fuga da convivência, sem compartilhamento, sem felicidade. Mais uma vez vou recorrer ao cinema para debater o sentimento de culpa e perdão, como oportunamente Clint Eastwood o faz no maravilhoso filme em que dirigiu e atuou “Gran Torino”.  Walt Kowalski é um norte-americano descendente de poloneses, que mora no meio-oeste dos EUA, que fica viúvo, morando sozinho, sem o menor contato com os dois filhos e os netos.

Rude e antissocial, além de racista, o típico “RedNeck”,  mora num bairro cercado de asiáticos, latinos e negros, seus filhos usam carros estrangeiros o que lhe provoca mais raiva, pois tinha trabalhando 50 anos na Ford. Sua única paixão, viva, era um carro, um “Gran Torino”, 1972, que ele conserva como uma relíquia. A morte da esposa o fará ainda mais recluso, passando o dia na varanda bebendo cerveja e sendo mal educado com os vizinhos. Sua casa é seu país, seu torrão, que ele amaldiçoa todos os instantes aqueles “estrangeiros” ali tão longe da costa, porque diabos vieram parar ali, no meio do nada, com frio durante seis meses do ano.

Para complicar a vida, o garoto da casa vizinha, Thao (Bee Vang), filho de imigrantes do Laos, é obrigado por uma gangue a roubar o carro de Walt. O plano é frustrado pela inabilidade do garoto e pela ação de Walt, mas isto fez com que ele mais odiasse os estrangeiros. Porém, a irmã de Thao, a inteligente Sue (excelente atriz Ahney Her) enfrenta o rude Walt, ele se espanta com a coragem da garota, acaba aceitando a amizade e mais ainda, vira um tutor do tímido Thao. A relação é dura, mas vai moldando cada um, modificando completamente aquele sujeito tão mal humorado. Aliás, o extremo mau humor dele chega a ser um fino humor.

A redenção de um passado complexo, de um ex-combatente de guerra, que conviveu com mortes, as mais absurdas, que se sente o maior patriota, mas não consegue se perdoar pelo horror da guerra, mas, ao mesmo tempo, não sabe viver com a diversidade, inclusive aquela provocada pela própria guerra, de seu país que age como império, que suga e absorve povos, tanto no território distante, quanto em seu quintal. A decadência do país se expressa, não na presença de “estrangeiros”, mas na Ford, no belo carro, Gran Torino.

Walt conseguiu salvar a si mesmo, da forma mais cruel, mas é uma redenção completa, que também a nós redimirá e o toque de humanidade lhe fará bem e o faz se reconciliar com seus medos e passado.

A beleza do filme está na crueza das relações impossíveis e improváveis, servindo de metáfora para nossas próprias limitações, nas nossas incapacidades de  convivência com aquilo que nos assusta, que nos leva ao extremo e abismo de comportamentos abjetos como xenofobia, racismo entre outros, quando todos somos apenas Humanos, nem importa de onde viemos, nem sabemos para onde iremos, por que não conviver? Amar? Respeitar?

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3 thoughts on “Gran Torino – Ato Penitencial”

  1. Já assistiu “Crash, no limite” ?
    Tbm é um filme que me assombra por mostrar vidas e comportamentos totalmente opostos entrelaçados sendo desconstruídos, construídos, revistos…

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