Arnobio Rocha Política O Outono da Velha Guarda Petista

928: O Outono da Velha Guarda Petista


 

Geração Histórica na Fundação do PT

Geração Histórica na Fundação do PT

“Pra lhe dizer que isso é pecado
Eu trago o peito tão marcado
De lembranças do passado
E você sabe a razão
Vou colecionar mais um soneto
Outro retrato em branco e preto
A maltratar meu coração”

(Retrato em Branco e Preto – Chico Buarque)

Estive no velório de Luiz Gushiken (Companheiro Gushiken? Presente, Hoje e Sempre!) e revi aqueles velhos quadros da esquerda brasileira, em especial do PT, ali estava reunida a mais importante e vitoriosa geração de militantes, boa parte forjada na ditadura, que foi decisiva na reconstrução do movimento sindical, social e político brasileiro, nos anos de chumbo. Aquele ousado grupo construiu oposições sindicais, venceu sindicatos, fundou a CUT, o PT, teve participação decisiva no processo de redemocratização do Brasil. Durante a constituinte, mesmo em ínfima minoria, trouxe os trabalhadores para o centro dos debates e incluiu pontos fundamentais na Constituição. Estes quadros temperados na luta chegaram à Presidência com um dos seus melhores quadros, Lula, o primeiro presidente vindo do povão sofrido e trabalhador.

Bem, vamos ser francos, toda esta geração de dirigentes do PT, começando por Lula, jamais será perdoada (Ao companheiro Luiz Gushiken) por ter ousado governar o Brasil. Suas vidas seriam e serão escrutinadas para sempre, o pecado de ter desafiado o poder tradicional, não será engolido, nisto se insere a questão do “mensalão”. Sem minimizar os fatos ocorridos, o PT aceitou o jogo eleitoral como ele é, com caixa dois, sobras de campanhas e montagem de base parlamentar, senão não se ganha eleições e principalmente, não se governa. Usou-se as armas para se vencer e governar, nada diferente dos outros 100% governos eleitos em qualquer época.

Sem entender estas questões vamos fica eternamente na condenação moral, jamais chegaremos ao essencial, que é mudar a lógica de se fazer política no Brasil, mas não apenas aqui, é uma lógica do Kapital, que se reflete em todas as eleições no mundo, quer seja aqui, nas eleições dos EUA ou agora na Alemanha de Merkel. Desprezar estes dados, em verdade, é abandonar a arena política, assim como fizeram os “indignados” espanhóis e entregaram o governo à Direita com uma maioria esmagadora, que mesmo com um governo fraco, corrupto, entreguista e de desmonte do Estado de bem-estar social permanece no poder. As lutas se dão em todas as cenas, não somos nós que escolhemos o cenário, muito menos as armas.

Olhei aquela cena, no cemitério, um momento de solidariedade, reencontro, mas de profundo pesar, notei que os principais quadros estão não apenas envelhecidos, mas destruídos fisicamente, de forma assustadora, a pressão, o isolamento político, o cerco diário midiático, a forma covarde de atacar a vida pessoal, a história de vida, parece que vai vencendo lentamente e letalmente os quadros, que mesmo experimentados, a energia já não é a mesma. O gosto pelo assassinato de reputações não lhes dará chances de defesa, quem sabe daqui a 49 anos a “Globo” pedirá desculpas ao Lula e aos seus companheiros.

O diálogo com esta nova geração que surge é truncado, poucos compreendem as razões políticas e ideológicas ou as opções de luta e vida que os velhos quadros tiveram, alguns preferem reduzir as questões a um moralismo tolo, muito próximo do que sai nos jornais e revistas vinculados ao grande Kapital. Há aqueles que foram construir pequenos partidos, radicalizados na forma, mas conservadores no conteúdo. Pouco ou nada de novo, diferente, se conseguiu de alternativo fora da experiência do PT, esta é a realidade. Por fim, surgem os liquidacionistas internos, que enxergam, em toda crise, a necessidade de “refundações”, velha e única tática das lições da esquerda europeia, que levou ao fim os grandes partidos de esquerda na Europa, hoje não passando de aglomerados ou “movimentos”.

O que nos aguarda não será nada fácil, os destinos da Esquerda  brasileira(PT volta à Planície) vai bem mais além da decisão do STF, pois esta é mera formalidade, para aqueles que condenaram estes quadros, já condenaram, de  nada adianta argumentar, não se darão o direito de pensar diferente do que já pensam, nisto a Direita usou com eficiência todo seu poder, Mídia e Judiciário, para criar o clima de condenação e linchamento prévio, qualquer questão técnica jurídica será vista apenas como manobra, para evitar condenação e prisão e espetáculo televisivo. Chegamos ao absurdo de um ministro do STF, Marco Aurélio Mello, pedir manifestações (seriam os “black blocs” ?) na frente da suprema corte, para pressionar seu colega a votar contra a apelação dos condenados. Refresquemos a memória, este mesmo Marco Aurélio deu Habeas Corpus a tipos como Cacciolla, o banqueiro amigo que deu um desfalque de 1,5 bilhões de Dólares, algo como 50 “mensalão”. Nem lembrou, portanto, o “clamor das ruas”, como, covardemente, apela agora.

A questão que se impõe, para a militância, é mais uma vez derrotá-los nas urnas e seguir em frente, reconstruir as pontes e formar novos quadros, respeitando os velhos, aceitando seus erros e acertos, porque a vida é bem mais complexa do que pensamos.

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16 thoughts on “928: O Outono da Velha Guarda Petista”

  1. “A questão que se impõe, para a militância, é mais uma vez derrotá-los nas urnas e seguir em frente, reconstruir as pontes e formar novos quadros, respeitando os velhos, aceitando seus erros e acertos, porque a vida é bem mais complexa do que pensamos.”

    Isso aí. Belíssimo e comovente texto.

  2. Emocionante, Arnobio! Concordo com CADA PALAVRA. “Pouco ou nada de novo, diferente, se conseguiu de alternativo fora da experiência do PT, esta é a realidade”. E esta é a nossa tragédia. Continuaremos no foco do ódio de classe. Que luta, puxa vida…

  3. Desafios sempre deram o tom durante toda a existência do PT e isto é o que o torna gigante diante de seus adversários que ferozmente tentam a sua desconstrução. O PT não pode esquecer sua militância aguerrida e nem também que foi o povo brasileiro quem lhes deu vitórias e é a este que deve satisfações. Quanto a velha guarda petista, como eu gostaria de conhecê-los e dar um abraço em cada um e dizer que devem se orgulhar de sua história.

    PS. Não sou filiada a nenhum partido, mas o PT está no meu coração. É sua história e a figura de Lula que admiro, tive sonhos que em seu governo se tornaram conquistas.

  4. O Lula talvez tenha vislumbrado isso. Tentando renovar com Haddad em SP. Mas não sei se a nova geração saiba realmente o que passou a velha guarda para que chegassem até aqui.

  5. Você expressou exatamente o que sinto. ” poucos compreendem as razões políticas e ideológicas ou as opções de luta e vida que os velhos quadros tiveram, alguns preferem reduzir as questões a um moralismo tolo, muito próximo do que sai nos jornais e revistas vinculados ao grande Kapital. Há aqueles que foram construir pequenos partidos, radicalizados na forma, mas conservadores no conteúdo. Pouco ou nada de novo, diferente, se conseguiu de alternativo fora da experiência do PT, esta é a realidade.”
    Avante companheiros! Não nos deixemos abater!

  6. Parabéns por suas palavras bem colocadas dentro do vivemos hoje, mas gostaria de dizer , aqueles lutadores assíduos se tornarão capitalista, e se esqueceram , a sigla PT era maior , do que os valores recebidos, tinha um povo ao seu favor, e poucos muito poucos conseguiram, jogar fora muitos anos de luta e confiança desta nação brasileira , saudades de quando era orgulho ostentar uma estrela vermelha no peito…

  7. A grande luta que garante aposentadorias de R$ 26.000,00, de forma vitalicia, todos empoleirados em ministérios e estatais e os trabalhadores da iniciativa privada, são tolhidos dos mais básicos direitos quando recorrem ao INSS. Que reforma “eles” fizeram? Nos bolsos antes vazios e agora cheios???? Que M…….

  8. A experiência do PT é única porque é prática. E sendo prática, real e paupável é perigosa.

    Em certa maneira, o problema todo é o de onde viemos (do proletariado, das fábricas, das Comunidades Eclesiais de Base, das boas Universidades) e onde chegamos (ao Planalto e ao poder). E isso assusta.

    Eu vejo o PT como um partido socialista e contraditório. Para mim, seu grande acerto foi impor uma agenda que garanta o mínimo aos mais pobres e o grande erro foi acreditar que, em sendo salva, a mídia lhe seria fiel.

    Durante a Ditadura os conservadores brasileiros não hesitaram em jogar milhões na miséria, no esgoto a céu aberto, na favela e no “estado policial”. .E não hesitarão em tentar solapar qualquer projeto diferente de poder. Está no DNA deles.

    E a esquerda e o PT precisam aprender isso. Jamais serão aceitos no baile. Jamais.

  9. Tive a oportunidade de estar lá com você nesse dia, trocamos impressões pelo telefone antes de irmos e fomos conversando no caminho. Tudo parecia suspenso, como um momento de inflexão. Gushiken não é o primeiro que morreu dessa geração, outros tantos militantes mais e menos conhecidos se foram, mas o China é a primeira perda no pós mensalão, esta reação concatenada que a direita preparou, baseada nas regras (ilegais) que ela mesmo criou para azeitar a máquina eleitoral. Toda a história do PT é de afirmação inequívoca da luta de classes, como você disse foi uma ousadia ter um projeto para ganhar uma eleição dentro de regras desiguais tanto do ponto de visto político, como econômico. Esta geração foi vencedora por mais que queiram criminalizar esta vitória.

  10. São textos deste tipo que os escravos da globo e de outras emissoras, bem como revistas ladras dos centavos e da consciência de algumas pessoas devem ver e ler. Julgar sem conhecer ou mesmo influenciado por uma mídia manipuladora e sensacionalista é muito fácil. se estivesse vivido os anos de perseguições e assassinatos capitaneados pelo poderosos capitalistas deste pais, talvez teria outra avaliação… Viva sociedade alternativa… sem a servidão do povo novamente aos palácios dos(as) dondocas que a 500 anos vinha dominando esta nação Continente…

    lutisilva3@hotmail.com

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