953: Alienação


Um, mais um, sempre um, entre tantos Uns

Um, mais um, sempre um, entre tantos Uns

“Is this the real life?
Is this just fantasy?
Caught in a landslide
No escape from reality
Open your eyes
Look up to the skies and see
I’m just a poor boy, I need no sympathy
Because I’m easy come, easy go
A little high, little low
Anyway the wind blows, doesn’t really matter to me, to me”

(Bohemian Rhapsody – Queen)

Sempre, ou nem sempre, vivendo sob pressão (Under Pressure): trabalho, família, futuro, passado, presente, saúde, doença, sorriso, tristeza, felicidade. Onde explodir? Para onde correr? Saber ou dominar determinado processo não significa melhor viver, ou compreender, de como suportar dos dardos adversos, sem envergar a alma e se manter firme, com algum sinal de dignidade e honradez? São os mistérios da vida, que nos aflige, não hoje, não sejamos estúpidos, mas de antes, desde as cavernas.

Que é mais nobre para a alma: suportar os dardos e arremessos do fado sempre adverso, ou armar-se contra um mar de desventuras e dar-lhes fim tentando resistir-lhes?” (Hamlet – W. Shakespeare)

Ao acordar, pelo menos 99% das pessoas começam a enfrentar o pesadelo da sobrevivência, quais as surpresas que o dia vai nos revelar, os projetos de ontem que ficaram incompletos, ou os novos que podem surgir, sem esquecer que boa parte não tem perspectiva alguma, vagarão pelo nada, à margem de tudo, vendo tudo e não sendo convidados a coisa alguma. A vida vista cruelmente pelas sombras, ou pelas sobras, a existência humana pode e, muitas vezes, se não a maioria das vezes, uma completa tortura, sem significado especial algum.

“É essa idéia que torna verdadeira calamidade a vida assim tão longa! Pois quem suportaria o escárnio e os golpes do mundo, as injustiças dos mais fortes, os maus-tratos dos tolos, a agonia do amor não retribuído, as leis amorosas, a implicância dos chefes e o desprezo da inépcia contra o mérito paciente, se estivesse em suas mãos obter sossego com um punhal? “(Hamlet – W. Shakespeare)

Construímos nossas alienações, absorvemos os conceitos e valores dos que nos cercam e a ideologia da sociedade, igreja, televisão, da escola, principalmente do trabalho, para espelharmos um mundo “feliz”, talvez isto acalme, amorteça o duro viver. As promessas escatológicas do pós-morte também servem para amenizar ou suportar a ideia de uma vida medíocre, sem jamais viver aquilo que fica pairando como “reino das possibilidades”, mas que se resumem apenas as baixíssimas probabilidades reais. Quanto mais o mundo se enriquece de encantos, inversamente proporcional, e contraditoriamente, ele mais diminuirá os “eleitos”, de forma ainda mais aleatória.

“Que fardos levaria nesta vida cansada, a suar, gemendo, se não por temer algo após a morte – terra desconhecida de cujo âmbito jamais ninguém voltou – que nos inibe a vontade, fazendo que aceitemos os males conhecidos, sem buscarmos refúgio noutros males ignorados?” (Hamlet – W. Shakespeare)

Verdade que pode, e dever haver, alguma outra realidade longe desta complexidade, destas privações, destas ambições de ver e não ter, desejar e não possuir, em que as pessoas relegam os valores e os poderes do fetiche geral dos mercados e dos seus (falsos) encantos. Será uma possibilidade feliz, ou apenas uma aceitação, ou melhor, resignação de que tudo aquilo, lá fora, não é real. Deparo-me com pessoas que falam deste outro mundo, desconfio da sinceridade das falas, sinto que são mantras repetidos para se conformar, convencer de como se vive, o que não é errado, ou mentira, apenas soa falso.

“De todos faz covardes a consciência. Desta arte o natural frescor de nossa resolução definha sob a máscara do pensamento, e empresas momentosas se desviam da meta diante dessas reflexões, e até o nome de ação perdem.…” (Hamlet – W. Shakespeare)

Pensamos, repensamos, na maioria das vezes apenas nos paralisamos com tais pensamentos, esperando tocar o fone, e continuar o dia, sem que novas reflexões voltem a nos assombrar e nos lembrar de nossa pequena existência. Sorriremos felizes, falaremos de futebol, de um novo filme, outra coisa qualquer, para simplesmente esquecermos e a vida seguir sem que nosso verdadeiro Eu, nos persiga e venha nos caçar.

Queen – ‘Bohemian Rhapsody’

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