Arnobio Rocha Reflexões O Saber Popular Nordestino

1960: O Saber Popular Nordestino


A cultura popular do nordeste de sábios poetas, de grandes ensinamentos morais e éticos.

E às vezes, recordando feliz mocidade
Canto uma sodade que mora em meu peito
(O Poeta da Roça – Patativa do Assaré)

De tudo que de mim disserem, não tenha receio em acrescentar mais, para qualquer direção que melhor lhe convier. É, se assim, lhe parece, nos lembra o bardo inglês, a medida da análise sobre alguém, está na régua e na balança usada, definida por nossos parâmetros, valores morais e éticos, não é algo neutro, na maioria das vezes diz mais sobre nós do que sobre o outro.

Meu pai, um sábio nordestino, dizia umas duas frases lapidares sobre julgamentos e críticas, coisas que não entendia muito quando era criança.

A primeira delas: “Não vim para construir estrada plana, mas para colocar uns catabilhos (quebra-molas) nelas“, o que será que ele queria dizer, depois entendi plenamente, os catabilhos são para criar certa dificuldade, até acordar o desatento e, ao mesmo tempo, tem a função de proteger a natureza, ainda que intuitivamente.

A outra frase que ele dizia quando começavam a julgar uns aos outros, apontando defeitos, ele mandava: “Fulano quer ser a palmatória do mundo“. Sensacional, no saber nordestino era a forma de expressar que ninguém é dono da verdade e não deve impor a sua verdade sobre as demais, como a única forma de pensar e ser, uma retidão que quase sempre não corresponde com a prática.

A frase do catabilho é extremamente adequada, desafiadora, pois o conformismo de viver para aplanar a estrada, é monótono demais, e a humanidade é mais complexa, o caminho da vida tem de ter sobressalto, uma certa emoção, que ao se distrair o carro dará um solavanco ao saltar um quebra-molas, vem a adrenalina e o susto, bombeando mais forte o coração.

Ao nos expormos, em qualquer campo, temos que nos preparar para as críticas, justas ou injustas, ao mesmo tempo que não pode deixa paralisar por esses julgamentos, ao contrário, é saber usá-los para melhorar e seguir em frente. Ninguém estar acima de críticas, como também virar alvo de maledicências e inveja, fuxico e outras pragas.

No meu caso, entendi cedo o sentido das sentenças, das regras morais que o velho tentava passar e seguia, o que também serve para não nos julgarmos tanto, somos anjos e demônios, natureza selvagem e racionalidade social, alternamos entre os dois, e temos sínteses próprias, em que construímos nossas jornadas, sem medo de errar ou de ficar aprisionados com os olhos alheios.

Nessas horas complicadas sinto falta das falas do velho, não eram conselhos, mas transmissão de pensamentos, de experiências e a compreensão sobre do que somos feitos, para quê existimos, isso tudo em meio a histórias, cheias de parênteses, entremeadas de mais e mais histórias, que pareciam não ter fim, que ouvia abobado de tanto saber popular.

Eita, saudade.

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